Deixem crescer o trigo! - diz Rosário Gama no DN
Citando Bertold Brecht “Todos os dias os ministros dizem ao povo Como é difícil governar. Sem os ministros O trigo cresceria para baixo em vez de crescer para cima”. O problema é quando o trigo quer crescer para cima e as intempéries e as ervas daninhas não o deixam…E o trigo faz falta para o pão!!! E o pão mata a fome !!!
Ao longo dos últimos anos, têm sido variadas as “intempéries”que geraram instabilidade nas escolas, (não deixando o trigo crescer…) desde a criação dos primeiros agrupamentos, às alterações dos planos curriculares, ao estatuto disciplinar do aluno, às alterações ao estatuto da carreira docente (divisão da carreira docente, modelo de avaliação do desempenho dos docentes), só para sublinhar as que mais impacto causaram…
Para que as “sementes” possam germinar sem obstáculos e consequentemente para que as Escolas tenham condições para garantir a qualidade, são necessários tranquilidade, rigor e exigência como forma de garantir o ambiente propício à eficácia nos processos ensino-aprendizagem. As Escolas não se compadecem com alterações permanentes ao nível da sua organização e ausência total de um olhar mais atento ao sucesso real dos alunos, que passa pela reorganização curricular, novos programas, uma cuidada e exigente formação inicial de Professores, um devolver da autoridade aos mesmos de forma a garantir um ambiente propício ao trabalho dentro da sala de aula, uma co-responsabilização dos Pais/Encarregados de Educação pelo cumprimento das regras escolares por parte dos seus educandos, uma aferição com a introdução de exames nacionais no fim de cada ciclo e, no ano terminal do Secundário (12º ano) a todas as disciplinas da Formação Geral e Específica.
Desde o dia 14 de Junho de 2010, data em que foi publicada em Diário da República a Resolução 44/2010 do Conselho de Ministros, abateram-se novas “intempéries” sobre as Escolas quer no que se refere ao número mágico de alunos (21) limite para que não sejam encerradas as Escolas do 1º Ciclo, quer no que se refere à criação dos “Mega-Agrupamentos” designados nesta Resolução como “Unidades de Gestão”.
O fecho das Escolas, com toda a implicação que tem no contínuo desertificar das zonas interiores, pode justificar-se se os alunos não tiverem equipamentos adequados à sua formação/educação mas, houve muitas freguesias que apetrecharam as suas Escolas investindo em equipamentos e criando condições idênticas às das Escolas para onde se deslocam agora os alunos. Ora esta medida tem que ser tomada em conjunto com as autarquias e, o facto de ter menos de 21 alunos, não deve ser determinante para o encerramento da Escola desde que a mesma reúna condições para realizar um trabalho sério e com qualidade. É preciso ter em atenção quão traumatizante é para os alunos, ainda crianças, saírem do seu meio familiar para um ambiente estranho e aí permanecerem durante todo o dia.
Por outro lado, a constituição dos Mega-Agrupamentos feita de forma apressada e tendo exclusivamente em conta a localização geográfica, revela o carácter economicista desta medida, o que, a ser posta em prática, se traduzirá numa inequívoca deterioração da qualidade da escola pública, através da desvalorização das questões pedagógicas, dificultando a promoção das aprendizagens, instituindo a direcção à distância, o que cria condições para mais indisciplina e, em resultado disso, mais insucesso e abandono escolar, bem como da indisciplina. Assistimos, pois, a uma quantificação pedagógica em detrimento evidente da qualidade. A gestão de proximidade é fundamental para a resolução de problemas de natureza pedagógica e disciplinar, os alunos mais novos (aqueles cujas Escolas vão ser “engolidas” pelas Escolas Secundárias) necessitam de uma presença permanente do Director/ Presidente, a quem reconheçam autoridade e a quem obedeçam em caso de perturbação. O abandono escolar não se resolve com o fusão das Escolas em “Unidades de Gestão”, designação que mais se adequa a unidades empresariais, que de modo nenhum queremos confundir com espaços de aprendizagem e formação.
Num documento enviado à Senhora Ministra da Educação, um grupo de Directores do distrito de Coimbra afirma não compreender que:
“- Se tenha avançado com a mudança do modelo de gestão e administração das escolas que foi polémico, para, passado um ano, se pôr tudo em causa, invocando a necessidade de implementação dos novos agrupamentos, que estavam já previstos;
- Não sejam respeitados os projectos para 4 anos elaborados pelos órgãos de direcção e que começam agora a dar os seus frutos;
- Se avance com as fusões nesta altura do ano, em que as escolas estão preocupadas com as avaliações dos seus alunos e já têm muito trabalho feito na preparação do próximo ano lectivo com base nos seus projectos educativos;
- Se lance um novo modelo antes de se definirem as regras a que estes têm que obedecer, deixando as escolas num vazio legislativo;
-O Ministério não respeite o trabalho dos seus colaboradores e que ignore que estes trabalham intensamente para que as suas escolas e alunos tenham sucesso;
-A qualidade de ensino e as questões pedagógicas sejam preteridas a favor de medidas administrativas desenhadas nos gabinetes sem um verdadeiro conhecimento da realidade”.
Subscrevi na íntegra este documento e afirmo, com toda a convicção que o Ministério da Educação ainda está a tempo de repor a serenidade nas Escolas.
Termino como comecei, com uma citação de um poema de Brecht adequado aos tempos que vivemos: “Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem”.
Maria do Rosário Gama
Directora da Escola Secundária Infanta Dª Maria (Coimbra)
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