Matrículas - nem simplex, nem gratuitas
Lá me dei ao trabalho de ler o Despacho de 11 de Junho de 2007 que, entre outras coisas, visa trazer simplificação de procedimentos para matrícula e renovação de matrícula.
No ponto 2.11 diz-se: no ensino básico a renovação de matrícula realiza-se automaticamente.
Ingenuamente eu até estava a pensar que assim iria ser - vi ao longo do ano os esforçados directores de turma a digitalizarem todos os dados dos alunos, a conferirem em reunião com os encarregados de educação os dados introduzidos, tudo preparado para o simplex. Ilusão de alma.
Hoje vi filas enormes de alunos à espera de comprar pela módica quantia de 15 euros o habitual envelope castanho, vi outros desesperados por não disporem do dinheiro. Nas costas do envelope lá segue um rol de papelada a apresentar e, embora tenha visto um director de turma a explicar aos alunos que, enfim, só terão de trazer aqueles documentos no caso de ter havido alterações, estou a imaginar a barafunda que tudo aquilo irá causar nas famílias.
É de hoje para amanhã e há que trazer três fotografias actuais - custo a acrescentar aos 15 euros (desconto para irmãos no agrupamento, cada um paga "apenas" 7.5 euros). Até os boletins de vacinas, verificados há pouco em sede de campanha de vacinação na escola, vão de novo na lista.
No despacho não vi indicado para esta renovação normal qualquer pagamento. Mas lá que é cobrado, é.
Numa zona altamente carenciada, com o apregoar da gratuitidade do ensino público, engulo mal tudo isto.
Em muitas destas famílias qualquer euro faz falta. Dei conta disso no post A Cidade - crimes e escapadelas de 20 de Junho. Conto outra significativa história.
Há uns anos, duas turmas, por trabalho desenvolvido na então chamada área escola, ganharam, como prémio atribuído por uma editora, uma visita à Eurodisney. Avião para lá e para cá, estada em hotel de quatro estrelas na zona, um luxo. Chegou-nos a notícia já depois de terminadas as aulas. Foi difícil contactar os alunos e tratar da papelada.
Lá andamos de casa em casa, de barraca em barraca. Numa destas a aluna tinha o BI caducado. Falámos à mãe na urgência de refazer o BI da filha para que daí a dois dias comparecesse com ele na escola para organizarmos todo o processo. Abanou-nos afirmativamente a cabeça. No dia aprazado não apareceu. Por entre os comentários de pais negligentes, gente preguiçosa e desinteressada voltámos à barraca. Os olhos da mulher explicaram-nos tudo o que não tivera coragem de nos dizer. Lá sacamos dos bolsos os escudos necessários para a deslocação a Lisboa, a compra dos impressos e as fotografias da ordem. No dia seguinte à tarde tínhamos o BI renovado na mão.
A absoluta falta deste (pouco) dinheiro privaria a aluna de participar nesta viagem que também ela tinha ganho.
Este ensino obrigatório gratuito tem muito que se lhe diga. E quanto a igualdade de oportunidades estamos conversados.
PS. Nunca consegui informação sobre a utilização desta quantia arrecadada nas matrículas pelo que disso não posso dar parte.
No ponto 2.11 diz-se: no ensino básico a renovação de matrícula realiza-se automaticamente.
Ingenuamente eu até estava a pensar que assim iria ser - vi ao longo do ano os esforçados directores de turma a digitalizarem todos os dados dos alunos, a conferirem em reunião com os encarregados de educação os dados introduzidos, tudo preparado para o simplex. Ilusão de alma.
Hoje vi filas enormes de alunos à espera de comprar pela módica quantia de 15 euros o habitual envelope castanho, vi outros desesperados por não disporem do dinheiro. Nas costas do envelope lá segue um rol de papelada a apresentar e, embora tenha visto um director de turma a explicar aos alunos que, enfim, só terão de trazer aqueles documentos no caso de ter havido alterações, estou a imaginar a barafunda que tudo aquilo irá causar nas famílias.
É de hoje para amanhã e há que trazer três fotografias actuais - custo a acrescentar aos 15 euros (desconto para irmãos no agrupamento, cada um paga "apenas" 7.5 euros). Até os boletins de vacinas, verificados há pouco em sede de campanha de vacinação na escola, vão de novo na lista.
No despacho não vi indicado para esta renovação normal qualquer pagamento. Mas lá que é cobrado, é.
Numa zona altamente carenciada, com o apregoar da gratuitidade do ensino público, engulo mal tudo isto.
Em muitas destas famílias qualquer euro faz falta. Dei conta disso no post A Cidade - crimes e escapadelas de 20 de Junho. Conto outra significativa história.
Há uns anos, duas turmas, por trabalho desenvolvido na então chamada área escola, ganharam, como prémio atribuído por uma editora, uma visita à Eurodisney. Avião para lá e para cá, estada em hotel de quatro estrelas na zona, um luxo. Chegou-nos a notícia já depois de terminadas as aulas. Foi difícil contactar os alunos e tratar da papelada.
Lá andamos de casa em casa, de barraca em barraca. Numa destas a aluna tinha o BI caducado. Falámos à mãe na urgência de refazer o BI da filha para que daí a dois dias comparecesse com ele na escola para organizarmos todo o processo. Abanou-nos afirmativamente a cabeça. No dia aprazado não apareceu. Por entre os comentários de pais negligentes, gente preguiçosa e desinteressada voltámos à barraca. Os olhos da mulher explicaram-nos tudo o que não tivera coragem de nos dizer. Lá sacamos dos bolsos os escudos necessários para a deslocação a Lisboa, a compra dos impressos e as fotografias da ordem. No dia seguinte à tarde tínhamos o BI renovado na mão.
A absoluta falta deste (pouco) dinheiro privaria a aluna de participar nesta viagem que também ela tinha ganho.
Este ensino obrigatório gratuito tem muito que se lhe diga. E quanto a igualdade de oportunidades estamos conversados.
PS. Nunca consegui informação sobre a utilização desta quantia arrecadada nas matrículas pelo que disso não posso dar parte.
9 Comments:
15 Eur? Mas é renovação de matricula ou inscrição nalgum Ginásio?! :o)
Colega
Como refere agrupamento deduzo que os vossos alunos são todos da escolaridade obrigatória. A estes é proibido cobrar qualquer tipo de verba. As DRE têm sido claras nessas orientações.
Era habitual cobrar esse tipo de verbas para " despesas de comunicação".
Os órgãos de gestão já não podem solicitar essa comparticipação aos alunos do ensino básico/ escolaridade obrigatória.
Maria Eugénia Pinheiro - também!!
Por lapso o comentário seguiu como anónimo. Peço desculpa.
Continue com este espaço interventivo!!
Também fiquei atónita com os 15 euros. Mas andamos num tempo em que já nada é de espantar :-(
Para o aflores
Quando os alunos se queixam de os estar a obrigar a escrever muito, digo-lhes que desenvolve e faz bem a uma série de músculos e que até poupam no ginásio. Afinal...
Obrigada pela visita
Para a minha mais completa homónima,eugénia pinheiro
Diz-me isso com conhecimento de causa já que as suas funções a isso a obrigam.
E agradeço-lhe a visita e a informação, embora preveja que nada consiga fazer com ela.
Ficará para outro post o desatino que tudo isto deu na escola/agrupamento.
E parece-me que houve inúmeras reclamações dos pais, muitos deles sem terem ainda recebido os curtos salários deste mês.
Um abraço para a Martins Pinheiro da Prata Pinheiro.
Para a ic
Entrou o seu comentário quando acabava de responder aos anteriores.
Esta já é uma prática antiga na escola contra a qual venho, sem êxito, barafustando.
Com o que se vai lendo e ouvindo e mais o simplex, pensei que este ano seria posta de lado mas, afinal, não abdicaram da extorsão.
Volte sempre
PS. As instruções da DRE por aqui ou são invocadas como lei ou ignoradas. É conforme convem e há cobertura para isto.
Possivelmente na Vasco da Gama, da Expo, não fazem cobrança. E está bem, é uma zona privilegiada!
No meu subúrbio não há privilégios, pagam e pronto.
Desde já lhe digo que os professores têm de aturar muito.
Os pais criaram monstros sem o saber, mas por culpa própria.
Ó cadeira do poder, está muito pessimista.
Em 34 anos de trabalho, não encontrei nenhum aluno monstro, nem pais monstruosos.
Encontrei gente às vezes atrapalhada com a vida , com a tarefa de educar, com o crescer.
Aturamos muita tonteria mas vem exactamente da sua cadeira, dos que lá se sentam.
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