Por mail
Recebi hoje por mail este texto que, devidamente autorizada, publico.
Ser professor em Portugal.
Escrevo este e-mail como resposta às muitas queixas que me vão enviando colegas professores e outros sobre a nossa profissão.
Achei por bem dar a minha opinião.
Sou professora do 1º Ciclo há 3 anos. Embora nestes três anos tenha encontrado algumas pessoas que pessoal e profissionalmente gostei de conhecer, até agora não tenho muito por onde defender a classe docente... Vejo e convivo com muito coisa que me desagrada.
Cheguei há 15 dias a uma escola onde a minha cara colega não me deixou nem projecto curricular de turma, nem sumários do que fez. E, acima de tudo, os alunos aprenderam muito pouco.
Esta é sem dúvida uma profissão altamente desgastante e exigente. Normalmente o fim de um dia de escola é como o fim de uma maratona. Demos atenção a muita coisa em simultâneo, amenizámos conflitos, reflectimos e raciocinámos para resolver questões e dúvidas...
Sim, as crianças conseguem levantar questões para as quais uma pessoa com uma boa cultura geral e uma formação universitária feita com leituras e reflexões não tem uma resposta imediata.
Tenho de chegar à hora exacta da aula, mas o que me preocupa não é a falta, são as meninas e meninos que estão à minha espera. Mas vejo muitos colegas acenderem cigarros na sala de professores, quando é a hora de entrar.
Também vejo muitos colegas a conversarem dentro ou fora das salas durante 10,15, 20 minutos, quando é hora da aula....considere-se aula expositiva ou actividades em que os alunos sejam mais os actores do seu caminho na aprendizagem.
Quase nunca faltei.Uma vez por ano. Mas já tive muitos colegas a faltarem para irem às Canárias, Caraíbas...Cinema...por aí fora. As férias que temos têm-me bastado mas nem pensem que as considero demais porque quem se dedica a sério chega ao fim de cada período fatigado de verdade.
A primeira vez que fiz um estágio numa escola é que percebi como isso era real. Ao segundo dia tive pela primeira vez na minha vida dores de cabeça. O mundo da escola é muito decíbel e agitação. Mas digo-vos que agora, embora nunca tenha dores de cabeça, canso-me a sério.
Trabalho aos fins de semana, trabalho depois de sair da escola e às vezes falo demais das proezas e desvarios d@s meus menin@s. Mas isso é que me dá alento...As relações que se constroem... As conquistas que fazemos, eu e eles.
Nunca tive problemas com pais ou encarregados de educação. Estive já em vários tipos de escolas, os guetos de Lisboa e dos subúrbios de Lisboa, zonas de classe média alta, meio rural. Sempre falei bem com toda a gente e todos me trataram igualmente bem.
Os alunos... Com esses sim, claro que tive problemas e vou tendo maiores ou menores todos os dias. Mas é essa a luta de ajudar a crescer, a ser feliz, a querer viver e aprender, gostar de tratar bem os outros e ser bem tratado. Gosto de reflectir e tentar mudar... Interrogo-me sobre o meu desempenho e às vezes não gosto. Mas tento dar o melhor, em carinho, em espírito científico, espírito crítico, ciências e artes... Às vezes penso que podiam ter aprendido mais. Reconstruo os meus valores e princípios com a experiência dos dias.
Alguns alunos telefonam-me nos anos. Outros convidam-me para jantar e passear. Falam-me no messenger. Ajudo alguns no que me pedem (imigrantes e afins), alguns que já nem são meus alunos.
E revolta-me a burocracia das secretarias, o desrespeito fundamental pelas pessoas, o desinteresse dos professores que desconstroem os processos que tínhamos iniciado.
Enraivece-me saber que o meu pequeno aluno chinês, um ás na matemática e que durante cinco meses, desde que chegou a Portugal, iniciei na língua portuguesa, está agora sentado no fundo de uma sala a fazer cópias de textos que não pode entender.
Ser professor em Portugal.
Escrevo este e-mail como resposta às muitas queixas que me vão enviando colegas professores e outros sobre a nossa profissão.
Achei por bem dar a minha opinião.
Sou professora do 1º Ciclo há 3 anos. Embora nestes três anos tenha encontrado algumas pessoas que pessoal e profissionalmente gostei de conhecer, até agora não tenho muito por onde defender a classe docente... Vejo e convivo com muito coisa que me desagrada.
Cheguei há 15 dias a uma escola onde a minha cara colega não me deixou nem projecto curricular de turma, nem sumários do que fez. E, acima de tudo, os alunos aprenderam muito pouco.
Esta é sem dúvida uma profissão altamente desgastante e exigente. Normalmente o fim de um dia de escola é como o fim de uma maratona. Demos atenção a muita coisa em simultâneo, amenizámos conflitos, reflectimos e raciocinámos para resolver questões e dúvidas...
Sim, as crianças conseguem levantar questões para as quais uma pessoa com uma boa cultura geral e uma formação universitária feita com leituras e reflexões não tem uma resposta imediata.
Tenho de chegar à hora exacta da aula, mas o que me preocupa não é a falta, são as meninas e meninos que estão à minha espera. Mas vejo muitos colegas acenderem cigarros na sala de professores, quando é a hora de entrar.
Também vejo muitos colegas a conversarem dentro ou fora das salas durante 10,15, 20 minutos, quando é hora da aula....considere-se aula expositiva ou actividades em que os alunos sejam mais os actores do seu caminho na aprendizagem.
Quase nunca faltei.Uma vez por ano. Mas já tive muitos colegas a faltarem para irem às Canárias, Caraíbas...Cinema...por aí fora. As férias que temos têm-me bastado mas nem pensem que as considero demais porque quem se dedica a sério chega ao fim de cada período fatigado de verdade.
A primeira vez que fiz um estágio numa escola é que percebi como isso era real. Ao segundo dia tive pela primeira vez na minha vida dores de cabeça. O mundo da escola é muito decíbel e agitação. Mas digo-vos que agora, embora nunca tenha dores de cabeça, canso-me a sério.
Trabalho aos fins de semana, trabalho depois de sair da escola e às vezes falo demais das proezas e desvarios d@s meus menin@s. Mas isso é que me dá alento...As relações que se constroem... As conquistas que fazemos, eu e eles.
Nunca tive problemas com pais ou encarregados de educação. Estive já em vários tipos de escolas, os guetos de Lisboa e dos subúrbios de Lisboa, zonas de classe média alta, meio rural. Sempre falei bem com toda a gente e todos me trataram igualmente bem.
Os alunos... Com esses sim, claro que tive problemas e vou tendo maiores ou menores todos os dias. Mas é essa a luta de ajudar a crescer, a ser feliz, a querer viver e aprender, gostar de tratar bem os outros e ser bem tratado. Gosto de reflectir e tentar mudar... Interrogo-me sobre o meu desempenho e às vezes não gosto. Mas tento dar o melhor, em carinho, em espírito científico, espírito crítico, ciências e artes... Às vezes penso que podiam ter aprendido mais. Reconstruo os meus valores e princípios com a experiência dos dias.
Alguns alunos telefonam-me nos anos. Outros convidam-me para jantar e passear. Falam-me no messenger. Ajudo alguns no que me pedem (imigrantes e afins), alguns que já nem são meus alunos.
E revolta-me a burocracia das secretarias, o desrespeito fundamental pelas pessoas, o desinteresse dos professores que desconstroem os processos que tínhamos iniciado.
Enraivece-me saber que o meu pequeno aluno chinês, um ás na matemática e que durante cinco meses, desde que chegou a Portugal, iniciei na língua portuguesa, está agora sentado no fundo de uma sala a fazer cópias de textos que não pode entender.
5 Comments:
Como te entendo, cara coleguinha!
Vais a andar bem mas prepara-te para levar na cabeça.
Pelo jeito, parece-me que terás cabeça para aguentar.
E os/as meninos/as podem sempre aprender mais. E aprenderão. Cada um a seu tempo.
Um abraço
Ve o blog
cambalhotamatematica.blogspot.com
e ve o filme
as palmas sao para ti
um beijo
"EDUCAÇÃO APÓS AUSCHWITZ
A exigência que Auschwitz não se repita é a primeira de todas para a educação. De tal modo ela precede quaisquer outras que creio não ser possível nem necessário justificá-la. Não consigo entender como até hoje mereceu tão pouca atenção. Justificá-la teria algo de monstruoso em vista de toda monstruosidade ocorrida. Mas a pouca consciência existente em relação a essa exigência e as questões que ela levanta provam que a monstruosidade não calou fundo nas pessoas, sintoma da persistência da possibilidade de que se repita no que depender do estado de consciência e de inconsciência das pessoas. Qualquer debate acerca de metas educacionais carece de significado e importância frente a essa meta: que Auschwitz não se repita. Ela foi a barbárie contra a qual se dirige toda a educação. Fala-se da ameaça de uma regressão à barbárie. Mas não se trata de uma ameaça, pois Auschwitz foi a regressão; a barbárie continuará existindo enquanto persistirem no que têm de fundamental as condições que geram esta regressão...
Theodor W. Adorno
(Resto do texto em http://adorno.planetaclix.pt/tadorno10.htm )
Outsider
Olá!
Também conheço desses professores que falas, mas tenho 26 anos de serviço e mais de 40 escolas!
Esses "professores" deviam ser punidos. Para isso deveria existir uma avaliação cuidada. Mas o meu medo é que sejam esses a fazer as avaliações, uma vez que os que gostam pouco de trabalhar com crianças serão os primeiros a candidatar-se a todos os cargos e mais alguns!
Por outro lado, esse tipo de gente está em minoria, não sei por que escolas (ou agrupamentos)tens andado, que autorizam tanta balda!
Espero que a jovem colega abra a caixa de comentários já que lhe são dedicados.
A Leonor bate-lhe palmas e junto-me ao aplauso a quem parece gostar do que faz e tenta fazê-lo bem.
O outsider lá me deu trabalho útil. Fui ler o texto aconselhado e, esquecendo a tradução que não é famosa, aprendi alguma coisa. Há que pensar até nas pequenas coisas que agrilhoam e deixamos passar assobiando para o lado porque é mais cómodo.
Ó Saltapocinhas, o problema é que estas minorias baldas estão em geral bem encostadas ao poder que as protege a troco de contrapartidas, pelo menos de apoio certo. O medo de que fala não terá razão de existir se a maioria não adormecer.
Em três anos esta professora deve ter passado por meia dúzia de escolas. Esse é um dos problemas para os alunos que trocam de professor como quem "troca de camisa".
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