A minha querida vizinha partiu.
Faz-me falta mas, com os noventa anos cumpridos, sei que queria descansar da fadiga física que a tomara.
Fico com as memórias.
Desde que aos dezassete anos cheguei ao esquerdo, ela foi, no direito, o aconchego certo e seguro. Eu e depois o marido e os filhos soubemos sempre que ela estava lá.
Tínhamos as chaves cruzadas.
Não me esqueço do dia em que, em simultâneo, as portas do esquerdo e do direito abriram para o jogo que jogávamos com frequência ó vizinha, dê-me lume.
Não era ficção, nem cinema, nem teatro, era o espetáculo que a nossa vida de amizade e confiança nos permitia produzir, encenar, realizar, interpretar. E rimos naquela plateia.
Cebola para cá, ovo para lá, o seu Zé, os meus Zé - Eduardo, a sua Graça, a minha Maria, o seu Vasco, a minha Salomé, tínhamos sempre para a troca.
Obrigada, querida vizinha.