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M. Eugénia Prata Pinheiro

sexta-feira, setembro 28, 2007

Excertos

Excertos de diagnóstico, 5º ano deste mundo outro:

- Por vafor mãe.
- Não sei.
- Enquado a tia esta na farnsa.
- Eonde encotrasde
- Foi na rua e tive pena e turcepara casa
- Tabem cofensete-me podemosa ficacoele mas quado a tua tia vier da franca fai para casa da tua avó.

- Pais porque é que não deixam o gatinho ficár cá em casa ele está muito magrino.
- O filha estábem protas fica lá com o gato. Disseram os pais.
- Yes!!! vosses são os menhores pais do mundo. Disse eu

- Nempesses que vanentar com esse cão.

levai um gato para casa e os meu pais não me daicharam telo mas eu enseti enseti e eles deseram o gato fica ca 3 dias se cudares bom dele nos pensamos melhore 1 dia tratai do gato dalhe de comer fislhe muintos carinhos e brincai com ele...

Chegei a casa com o gato.
Premeiro foi falar com a minha mãe ela dice que com o meu pai.
Depois do jantar, o meu pai chamo-me.
A tua mãe falo-me que encotra-te o gato na rua.
- Sim pai. Encomtei na rua ao pe do campo de fotebol.
O meu pai dice que não pediamo ficar com ele Mas eu dece que gostava muito dele e eu comvecio e ele dice que sim. Eu ficai co o gato e dei o nome bolinhas. Eu e o bolinhas difertimos muito.

Estes são apenas alguns excertos. Que fazer? Cantigas, ora, ora, cantigas!

Senhora ministra
Venha cá abaixo
Diga-me um caminho
Sozinha não aixo!

Douto e sabedor
Senhor secretário
Mande-me uma luz
Por um cumentário.

Senhora presidenta
Meça, meça, meça
O meu empenhamento
Por certo, ora eça.

Contra o abandono
Pelos resultados
Já lhes sei os nomes
Já tamos falados.

Este ano são 28
P'ró ano serão 30
Nem temos cadeiras
Mas fasche uma finta.

Vem-me à cabeça o meu velho e excelente professor Óscar Lopes, em casa, ainda no Porto. A determinado momento da sua vida, ele gostaria de ter ido dar aulas para o então chamado ensino primário. Estou longe da sua sabedoria mas também me apetecia o 1º ciclo para tentar compreender por que fica vedado a tantos o domínio da língua.






terça-feira, setembro 25, 2007

Descontinuidades

Volto às salas da minha escola deste meu mundo outro agora a abarrotar de gente. Este ano enfiaram-se naquelas salas turmas de 26 alunos, do 6º ano, ou de 28 alunos do 5º. Para lá da falta de ar e da oferta gratuita de sauna, o espaço exíguo para tantos alunos quase não me permite circular pelas coxias. Cuidado máximo para não lhes perturbar a escrita nem lhes derrubar os cadernos. Não sendo anoréctica, também não sou obesa mas, ainda assim, não consigo evitar um piparote aqui, outro piparote acolá. E, continuando a chegar ao 5º ano alunos que não dominam de todo, ou mal dominam, a leitura e a escrita, é forçoso esse trabalho mais próximo que fica quase interdito.

No ano passado trabalhei com duas turmas de 5º ano. O normal seria aplicar aquele conceito de continuidade pedagógica defendido no mundo real. Aqui neste mundo outro aplica-se consoante. A mim e aos meus alunos frequentemente não se aplica.

Este ano lá exterminaram uma das turmas com que trabalhei. Razões aleatórias. Não teve grande êxito mas não foi a turma com maior insucesso do 5º ano.
A turma tinha sido constituída nos seguintes termos:

Cinco alunos – permanência de 7 anos no 1º ciclo (um deles não aprendera a ler)

Dois alunos - 6 anos no 1º ciclo (um deles não aprendera a ler e o outro mal conseguia fazê-lo)

Quatro alunos – 5 anos no 1º ciclo

Três alunos a repetir o 5º ano

Nove alunos com indicação de 1º ciclo satisfatório

Um aluno acabado de chegar do Brasil com um nível satisfatório

Esta constituição de turma indiciava dificuldades que se agravaram com circunstâncias diversas:

Três professores da turma (os dois de EVT e a professora de Matemática/EA) meteram baixas prolongadas o que implicou a sua substituição, no caso da Matemática com intermitências e estando depois doente por um período superior a duas semanas a própria professora que substituía a professora titular da disciplina.

Tudo isto reduziu o número de aulas e aumentou o número de actividades de acompanhamento educativo apoiadas por variados professores, o que contribuiu para aumentar a desestabilização da turma. Neste mundo outro estas actividades transformam-se frequentemente em acompanhamentos deseducativos.

O horário da turma concretizava-se em mais de doze salas. Lá andavam os alunos saltando de sala em sala com a carga às costas.

Não foi possível encontrar uma solução que permitisse um apoio dedicado àqueles alunos que não conseguiam ler. Propus trabalhar com eles nos meus furos já que neste mundo outro o meu horário ultrapassava as vinte e nove horas de permanência na escola. Não foi autorizado porque perderiam algumas das suas aulas que coincidiam com os meus furos, blá, blá, blá... perderam-nas todas porque se fartaram e abandonaram a escola.

Transitaram catorze que foram espalhados por outras turmas. Requeri em Julho ficar com a turma onde tinham incluído oito destes alunos, turma que não tinha professor de continuidade.Tivera um professor contratado agora desempregado. Soube em Setembro, dois dias antes do início das aulas, que o meu requerimento fora indeferido.

A distribuição do serviço neste mundo outro é fantástica. A um professor do grupo História/LínguaPortuguesa, que leccionou Língua Portuguesa com sucesso reconhecido, atribui-se História; a um professor do mesmo grupo, que gosta de leccionar a História e que nunca leccionou a Língua Portuguesa, atribui-se a Língua Portuguesa. Foi este mesmo que ficou com aquela turma. São enviesados os caminhos do êxito.

Com a minha jurássica licenciatura em Filologia Românica, vou mantendo a Língua Portuguesa e, por tabela, o Estudo Acompanhado e lá mantive um 6º ano de continuidade. Ganhei um 5º ano, o tal de 28 alunos que me garante a prática de slalom.

Prometi a mim mesma que, no ano em que não conseguisse ter dominado todos os nomes dos alunos no final da primeira aula, meteria a papelada para a reforma. Ainda não é este ano. Vai-me valendo (ou desvalendo?) o meu santo Alzheimer.




quarta-feira, setembro 19, 2007

Coincidências

A partir de hoje apenas escreverei ficção. Se se encontrar semelhanças entre o que escrevo e a realidade será por mera coincidência.

Haverá personagens por aqui. Ministros, secretários, presidentes disto e daquilo, coordenadores daqueloutro, professores, alunos, pais, funcionários... e até um eu ficcionado a meu gosto. O real (ou virtual?) prazer de ser autora.

Cá vamos.

Neste mundo outro a minha escola é daquelas que têm pavilhões provisórios há mais de 20 anos espalhados por três áreas do terreno. Chamamos-lhes Madeira, Açores e Berlenga. A Madeira e os Açores têm tipologia semelhante. Disposição das salas em u, um pátio interior que termina no portão, o único acesso àquela reserva. Exterior em madeira, cobertura em fibrocimento, pseudónimo para o amiantocimento. Janelas e bandeiras com vidros já terão tido. E possivelmente basculavam para que o ar circulasse e se renovasse. Agora o plástico, o tabopan, o cartão substituem os agressivos vidros e quase todas estão pregadas. Deixaram de ser janelas e bandeiras. Não inspirariam o Gedeão. No interior, a luz sempre acesa reflecte-se nos quadros sebosos. No chão cimentado jazem uns resquícios de revestimento, uns quadrados soltos de linóleo ou oleado.

Neste ano lectivo, trabalho sempre nestas ilhas. Com curiosidades suplementares: os famigerados blocos de noventa minutos de aulas distribuem-se pelas duas ilhas principais que distam uns valentes metros uma da outra, obrigando a contornar a Berlenga (tira de três salas semeada no terreno com as mesmas características estruturais). Assim, os primeiros 45 minutos são na Madeira com uma turma e os últimos nos Açores com outra turma. Os colegas garantem que um catamarã ultra-rápido está disponível para a travessia mas ainda não logrei apanhá-lo. Nem vê-lo. Os 45 minutos desta última aula lá ficam ratados pelo trajecto. Mantenho ainda, juro, alguma agilidade e, de há três anos para cá, transporto a minha mobília (livros, cadernos, dicionários, prontuários, fichas...) numa pasta grande com funcionais rodas - o meu Bobi. Ainda assim, nestas andanças, lá vão uns minutos de aula.

Já que apresentei o Bobi, digo também das minhas mal fundadas esperanças - pensei que dando vida ao Bobi, incitando-o anda Bobi, advertindo-o cuidado Bobi, olha o degrau, admoestando-o malvado Bobi que atropelaste o Pedro, travando com os alunos interessantes diálogos - então, setora, o Bobi está bom? - nem por isso, apanhou chuva e constipou-se! ou - anda cansadote! ou - hoje vem contente com carga aliviada! ganhava um passaporte directo para a ambicionada reforma. Embora goste muito do que faço, estou farta de gastar paciência com a tutela e aqueles senhores das juntas médicas, por proposta directa da hierarquia, poderiam passar-me pelo menos uma baixa prolongada. Há tantos que por nada gozam dela!

Talvez a hierarquia se inspire neste texto e agarre a ideia para se livrar de mim, já que os processozitos disciplinares emperram um bocado.

Oh, diabo, neste mundo outro estou a criar juntas médicas eficientes ao serviço de hierarquias safardanas. Muito pode a imaginação!

Teria outra vantagem imediata - eu que ainda não percebi de que é que sou titular, ficaria titular da baixa prolongada.

Mas, até agora, o meu Bobi só tem servido para agilizar percursos e tornar próximo o conceito de personificação.

Hoje páro por aqui. Como as escolas do nosso mundo real têm excelentes condições, cansou-me este exercício de ficcionar pavilhões escolares insalubres neste meu mundo outro. Precisei de pensar muito, foi muita construção.


quarta-feira, setembro 12, 2007

Tecnologias mafiosas

No final do ano lectivo fizemos provas "globalizantes" para os nossos quintos anos. Com um aparato cénico que se pretendeu semelhante ao das provas de aferição. O Departamento de Língua Portuguesa funcionou certinho, tudo tratado em tempo devido, excelente colaboração entre os professores do departamento envolvidos. Provas trocadas e correcções executadas em tempo breve.
Oito dias depois de realizadas, estavam corrigidas.

Logo que recebi as provas das minhas turmas, entreguei-as aos alunos, tomaram conhecimento da avaliação obtida e fizemos a correcção. Pedi no final que me devolvessem as provas, informando-os de que iria tirar notas sobretudo do modo como cada um tinha concretizado o trabalho de expressão escrita de modo a, como costumo fazer, comentar progressos e avançar processos de eliminação de falhas. Todas estas indicações seriam úteis quer para a avaliação final de ano quer para o trabalho no próximo ano lectivo.

Numa de "eficácia" decidi enfiar em excel as grelhas manuscritas que as colegas correctoras me tinham entregado, o que me daria um panorama mais claro das percentagens de êxito item a item.

Num dos alunos, a soma registava uma diferença de mais seis pontos. Foi fácil perceber o que se passara. Numa sequência de perguntas cotadas para seis, um deles ficara para trás. Uma falha fácil de acontecer e que nem uma nem duas revisões muitas vezes detectam. A tecnologia é que nisto, em geral, não falha. E era a diferença entre um 45,5 (não satisfaz +) e um 51,5 (satisfaz-). Comuniquei à colega correctora o lapso e imediatamente esta me solicitou que pedisse desculpa ao aluno e corrigisse a nota final. Assim fiz.

E isto bastou para ser acusada por gente do Departamento de Matemática de corrigir a prova já antes corrigida. Acusação secreta que secretamente passou à presidente do CE que secretamente passou à coordenadora de Língua Portuguesa que secretamente reuniu com a coordenadora de Matemática e a demais gente incomodada com a minha falta de profissionalismo. Reunião urgente dos professores de Língua Portuguesa do 2º ciclo a mando da coordenadora, a mando da presidente do CE. Ninguém me falara de nada, ninguém me perguntara coisa nenhuma sobre este assunto. Nem a mim nem a qualquer dos outros professores de português envolvidos no processo. Explicámos, a professora correctora e eu, o que se passara. Os professores de Língua Portuguesa presentes na reunião indignaram-se com tais processos. Lá ficou em acta.

Seguiram-se episódios curiosos que fornecem material para pedagógicas peças teatrais. Um dia as escreverei com sugestões para cenários, marcações de cena, música para contraponto, descrição cuidada de personagens, guarda-roupa...

Absurdos campeonatos estes! A ver se em próximos jogos me deixam ficar no banco que já estou velha para estas surpreendentes pantominas. E quem pensa que com 34 anos de profissão já não vai ter experiências inovadoras, inusitadas, inauditas, inimagináveis, está absolutamente inganado.

Portanto, cuidado com o excel!

P.S. Referi-me a estas ignóbeis exclusões do concurso para titulares no texto Sócrates peripatético de 14 de Abril. E lá fica à vista a perversidade de tudo isto. Um professor com 32 anos de seviço e os últimos 23 no quadro da mesma escola foi agora dela enxotado. É das áreas tecnológicas, tem um curso adequado à função mas que não é equiparado a licenciatura. Parara no 9º escalão e foi impedido de apresentar candidatura a titular. Assim, viu-se agora ultrapassado por um colega muito mais novo, com muito menos anos de serviço, do 8º escalão, que pôde ganhar a titularidade. Ficou sem horário. Restou-lhe emalar a trouxa e zarpar...

terça-feira, setembro 04, 2007

Resultados perversos...

Resultados perversos das férias. Cai a gente na ilusão de que naqueles dias longe da escola, da ministra, da net, o "mundo" andará e andará tão bem que, no regresso à lida, se encontrarão corrigidas as coisas que nos causaram perplexidade e incómodo! Começa Setembro e caímos no real.

A iniquidade do tal concurso para titulares está à vista. Os júris revelaram-se na sua incompetência. Os tais cinco pontos que deveriam ter sido atribuídos aos professores em serviço nas escolas pela avaliação de satisfaz não foram atribuídos e isso deixou de fora inúmeros professores do 10º escalão, aqueles do jurássico com mais de trinta anos de trabalho. Que há situações de injustiça, brada-se. Naturalmente que há. Agora chamam-se alguns desses professores e propõe-se-lhes, assim muito generosamente, que aceitem ficar como titulares, por um ano, em comissão de serviço. Sem mais. Brincadeiras!

A senhora ministra anda azafamada a correr das televisões para as rádios, das rádios para os jornais. É preciso convencer o público de que toma medidas interessantíssimas que facilitarão a vida às famílias. Um jogo de enganos. Tira daqui e põe acolá. Entretanto fecha escolas, aumenta o número de alunos nas turmas, atira professores pela borda fora e faz uma discreta mobilidade de funcionários públicos, reenviando para as escolas gente que há dez, catorze ou mais anos tinha deixado de dar aulas. Pois, pois, é que a natalidade está em quebra acelerada.

E enquanto não nascem crianças, essas universidades privadas e públicas avalizadas pelo sistema dão à luz milhares de "licenciados em professores" que ficam a chuchar no dedo. Mas os tais ministérios ligados ao ensino não têm nada a ver com isso, o problema transcende-os, não é deles. E, na verdade, não seria lícito pedir ao professor Mariano Gago que se pusesse a gerar crianças ao ritmo a que gera profes. Mas e se se alargar a progenitura? Se todos os machos que professam por essas universidades fora forem instados a ter pelo menos dez filhos? Dez filhos em, vá lá, dois anos e endireita-se a ratio. E se estiver aqui, nesta capacidade geradora, a pontuação necessária para acesso às cátedras, o critério para contratações e promoções?

Opto por brincar porque o assunto é demasiado sério. Fica a nu a desintegração desta construção em que nos esforçamos por ir vivendo.

Na escola lá se vai fazendo de conta. Lá se mudam umas coisitas para que tudo fique na mesma. Mas com a expectativa da chegada de computadores e quadros interactivos que tornam o "na mesma" muito mais produzido. Até me contaram nas férias (nunca ficámos tão fora quanto gostaríamos) umas histórias de trapaças nos fornecimentos destes produtos, concursos esquisitos, empresas que vão à falência dum lado para reviverem doutro... sinceramente, não fixei - demasiado déjà vu.

A propósito destas tecnologias feiticeiras tive que travar diálogo na caixa de comentários do texto Com tratantes de escola que analisava os critérios para as colocações de escola. Transcrevo parte...

SaltaPocinhas said...

Cá o meu critério seria medir pelo menos 1,90 metros...
Não é só por gostar de gente alta (homens, já agora...) mas porque tenho na minha sala um quadro interactivo e ninguém com menos dessa altura chega ao tecto para endireitar o projector que passa a vida fora do sítio!

Setora said...

Ó saltapocinhas, estás cheia de sorte. Isso é que é avanço tecnológico! Com que então, quadros interactivos! Sim senhora!

Pensando melhor, os da minha escola, pretos ou verdes rançosos, para escrever com o velho giz poeirento, também promovem significativas interacções.

Escreve-se neles com dificuldade pela sua condição sebosa, o que naturalmente impede a leitura escorreita, problema agravado com a iluminação que provoca reflexos impeditivos da descodificação do escrito, a partir de diversos pontos das sala.

E então, "ó setora, o que é que diz ali?", e movimentam-se para encontrar o melhor ponto de luz, caminham até ao quadro para lhe pôr o nariz em cima ou usam de imediata criatividade e inventam o que não conseguem ler.

As deslocações suscitam sub-reptícias rasteiras, promovem quedas aparatosas dos malfadados dossiers A4 que se estendem para as coxias. Podem seguir-se ligeiras batalhas.

Em suma - comunicação, movimento, acção, imaginação, interacção.

Estava com inveja do teu quadro e, depois deste exercício, fiquei a achar que o meu é melhor que o teu.

Até me esqueci do homem de metro e noventa que, na verdade, faz jeito em qualquer escola. Critério admitido!

... antes que me ponham muda e queda na sala de aula.