Pedro Lomba, no
Público - excerto final do texto
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A celebração da nossa independência também não esconde as muitas dependências
individuais com que cada um vive a sua vida. Em Portugal acumulamos listas indetermináveis
de dependências. Dependemos do Estado e, como por cá o Estado se confunde com o Governo, estamos sempre à mercê de quem ganha as eleições. Dependemos de mil e uma leis e regulamentos e de mil e uma interpretações sobre essas leis e regulamentos, de funcionários que dependem de outros funcionários e de superiores que dependem de outros superiores, dos
poderes do fisco e dos corredores sinistros da nossa justiça abstrusa e encaracolada. Basta sermos apanhados pelas malhas de um para não sabermos o que esperar. Numa magnífica entrevista ao i, António Barreto explicou o mecanismo psicológico da dependência que
continua a crescer entre nós. A dependência é a incubadora do medo e do silêncio. E o medo e
o silêncio são os piores inimigos duma democracia livre.
O que há para comemorar então no 1.º de Dezembro?
Há pouco tempo pus-me a pensar na seguinte pergunta: será legítimo uma pessoa gostar e
defender o seu país se este, longe de ser recomendável, decente e organizado, for antes
um país sem futuro, cheio de oportunistas, cleptomaníacos e governantes sem escrúpulos?
Teremos algum dever moral de defender um país que parece ter sido capturado por uma rede de predadores que usa o poder em seu próprio benefício?
Para alguns a resposta é fácil: “o meu país, certo ou errado”. Mas este patriotismo retórico nunca me convenceu. O patriotismo não pode ser a exaltação das virtudes de um país contra os outros, nem assistir resignado ao nosso envilecimento colectivo. Para minha informação,
o meu amigo Eduardo Nogueira Pinto fez-me ver há tempos que aquela frase célebre tem uma
formulação mais completa: “O meu país, certo ou errado: se certo, que se mantenha certo; se errado, que se torne certo”.
Quer dizer então que a liberdade de existirmos como país não serve de nada se não formos exigentes, críticos, insatisfeitos, até que os aldrabões e os governantes sem escrúpulos saiam dos lugares que ocupam. Os conjurados de 1640 estavam descontentes com quem os governava e resolveram por isso agir. Este é o único sentido de independência que ainda nos sobra. Já que este país é o nosso, não vamos deixar que no-lo estraguem ainda mais. É uma luta permanente. (Jurista)