Apanhei por aí
A ASAE Vai aferir as "Balanças das Ceguinhas " em 145 Domus -Justitae...
Os alegados defensores da escola pública são os seus maiores inimigos. Porque não respeitam alunos e famílias
Não houve acusação de corrupção, mas não se apurou o destino do dinheiro. Se houve crime, prescreveu
Se dúvidas havia, dúvidas há. O despacho final do Ministério Público no inquérito ao licenciamento do Freeport manda arquivar os autos no que toca a eventuais crimes de corrupção e tráfico de influência, mas deixa claro que não foi encontrado o destino de avultadas verbas que passaram pelas mãos de alguns arguidos.
A única acusação proferida respeita à alegada tentativa de extorsão praticada por Manuel Pedro e Charles Smith, donos da consultora Smith & Pedro (S&P) junto do grupo Freeport, e tem por base sucessivos pedidos de dinheiro que aqueles fizeram para pagar subornos e que não terão sido satisfeitos. Outra coisa são os pagamentos feitos à S&P e a vários arguidos pelo grupo Freeport e outras empresas ligadas ao projecto, cujo destino final não foi esclarecido e que poderiam estar relacionados com pagamentos ilegais a que há abundantes referências em documentos e testemunhos constantes dos autos.
No primeiro caso destacam-se os pedidos transmitidos por Smith a responsáveis do Freeport, em Setembro de 2001, para, ao que afirmava, pagar ao PS 3.000.000 (sem referir a moeda de que falava) e 300.000 a cada um dos outros partidos concorrentes às autárquicas de 2001 em Alcochete (CDU, PSD e CDS). Três meses depois terá pedido também dois milhões de libras (perto de 2,4 milhões de euros) para conseguir a aprovação ambiental do projecto. Já antes, em Abril de 2000, terá pedido 22 mil contos (110 mil euros) para pagar ao lobby. E mais tarde, em Maio de 2002, foi a vez de pedir 80 mil libras para entregar a alguém referido como "Pinóquio", através de um tal "Bernardo". vindo logo no mês seguinte a solicitar mais 50 mil. De acordo com as perícias financeiras, não foi encontrada prova de que o essencial destes pedidos tenha sido satisfeito, razão pela qual a acusação de extorsão se limita à "forma tentada".
Já no que respeita aos fluxos financeiros de que foram encontradas provas nas contas bancárias no período de 2000 a 2005 e em relação aos quais o despacho diz que se mantêm "dúvidas" quanto ao seu destino, avultam os cerca de 1,8 milhões de euros que o grupo Freeport transferiu para as contas da S&P. O mesmo acontece com 945 mil euros que saíram desta empresa para as contas de Smith e com os 936 mil que seguiram para as de Manuel Pedro. Sem finalidade conhecida há também metade dos 1,5 milhões que o consórcio Somague/Edifer (que fez a obra do Freeport) pagou à S&P e ainda 473 mil que foram levantados em numerário das contas da S&P. Dúvidas persistem igualmente quanto a 181 mil euros em numerário e a uma transferência de 247 mil euros (em libras inglesas) que entraram nas contas de Smith, e a 209 mil em numerário depositados em nome de Manuel Pedro, além de uma transferência de 120 mil euros de Smith para Pedro.
Por conhecer, entre outras verbas menores, ficou também a origem e o destino de parte dos sete milhões de euros que foram transferidos para o arquitecto Eduardo Capinha Lopes (que assumiu o controlo do projecto do Freeport no final de 2001), a partir de contas sedeadas em paraísos fiscais e com titulares não identificados. Pouco claras mostraram-se ainda, pelo menos em parte, os depósitos em numerário de 150 mil euros e de 111 mil euros feitos, respectivamente, em nome de Carlos Guerra (ex-presidente do Instituto da Conservação da Natureza) e de José Inocêncio (ex-presidente socialista da Câmara de Alcochete), ambos com intervenção determinante em diferentes fases do licenciamento do Freeport.
Na impossibilidade de apurar o destino efectivo destes valores, não restava ao Ministério Público outra hipótese que não fosse a de arquivar o processo no tocante a eventuais práticas de corrupção e outros crimes económicos.
Mas, como as perícias urbanística e ambiental efectuadas no final de 2007 e em 2008 concluíram que o licenciamento do Freeport não envolve a prática de actos ilícitos, mesmo que se encontrassem eventuais corruptos, o crime já estaria prescrito desde Março de 2007. Isto porque os crimes para a prática de actos lícitos prescrevem ao fim de cinco anos.Nas contas de Carlos Guerra foram depositados 150 mil euros em numerário. Explicou que era de uma partilha
Ministério Público diz que "importaria" ouvir o primeiro-ministro e elencou 27 perguntas a fazer-lhe. "Por ora" essa diligência foi "inviabilizada"
Afinal, José Sócrates não pode afirmar "finalmente", como fez anteontem, numa declaração à imprensa a propósito de uma nota difundida pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal sobre o despacho final do inquérito ao licenciamento do centro comercial Freeport, em Alcochete. O seu papel no processo está longe de estar esclarecido, entendem os procuradores do Ministério Público (MP) que dirigiram o inquérito, e foram apenas os prazos impostos pela Procuradoria-Geral da República para o fim do processo que impediram que ele fosse interrogado.
"Após a análise do inquérito e compulsados todos os elementos que dele constam, verifica-se que, nesta fase, importaria, não obstante a ausência de qualquer proposta neste sentido por parte da Polícia Judiciária, proceder à inquirição do então ministro do Ambiente, actual primeiro-ministro, e do então secretário de Estado do Ordenamento do Território e da Conservação da Natureza, actual ministro da Presidência", afirmam os procuradores Paes de Faria e Vítor Magalhães na página 100 do despacho final assinado na passada sexta-feira.
"Na verdade, foram eles os principais decisores políticos do processo de licenciamento [...] e, além do mais, foram referidos em diversos documentos apreendidos e em depoimentos prestados" nos autos, justificam os magistrados. Logo a seguir, elencam um conjunto de 27 questões que "importaria que o então ministro do Ambiente esclarecesse" e dez outras que deveriam ser dirigidas ao "secretário de Estado do Ambiente" (que na altura era Rui Nobre Gonçalves), tudo levando a crer que a anterior referência ao ex-secretário de Estado do Ordenamento, Pedro Silva Pereira, resultou de um lapso.
A importância de ouvir Sócrates e Rui Gonçalves é desenvolvida no capítulo do despacho intitulado "Diligências não realizadas/concluídas", onde são também referidas quatro cartas rogatórias dirigidas a autoridades judiciais estrangeiras e que ainda não obtiveram resposta. Uma delas tinha por objectivo a inquirição de Sean Collidge, ex-presidente do grupo britânico Freeport.
Os procuradores - que receberam o relatório final da Polícia Judiciária no dia 21 de Junho - explicam que o vice-procurador-geral da República proferiu um despacho, no dia 4 do mês passado, em que fixou o dia 25 de Julho como o do fim do prazo para o encerramento do inquérito. "Tendo em atenção este facto", e o disposto na lei do Conselho de Estado quanto à obrigatoriedade de obter autorização daquele órgão para ouvir o primeiro-ministro, os titulares do inquérito concluem que "mostra-se, por ora, inviabilizada" a inquirição de José Sócrates e a realização das restantes diligências referidas, deduzindo-se assim o despacho final.
Perguntas que o MP não fez
Entre as 27 perguntas que os investigadores dizem não ter podido fazer ao primeiro-ministro, destacam-se as seguintes, reportando-se sempre a documentos e depoimentos constantes dos autos: "Confirma a recepção, na sua residência, de uma carta que lhe terá sido dirigida pelo arguido Manuel Pedro, tratando-o por "Caro amigo"?"; "Confirma ter havido um apoio efectivo da família Carvalho Monteiro [tio e primos de Sócrates] ao licenciamento do Freeport?"; "Encontra alguma explicação" para o teor das declarações produzidas nos autos por Hugo Monteiro (seu primo), segundo o qual a reunião promovida pelo pai com o então ministro do Ambiente "foi realizada e contribuiu decisivamente para o licenciamento" do Freeport?; "Encontra alguma explicação" para as declarações de Hugo Monteiro "no sentido de que, ainda antes da apresentação do projecto, foi ter consigo, a sua casa, na Rua Braancamp, em Lisboa, perguntando-lhe se não se importava que ele invocasse o seu nome, para prestigiar o projecto, ao que terá respondido afirmativamente?"; "Como explica o envio, através da conta de correio electrónico josesocrates@ps.pt, de uma mensagem de propaganda eleitoral ao arguido Charles Smith (charlessmith@mail.telepac.pt), sendo certo que o mesmo é de nacionalidade estrangeira e não inscrito nos respectivos cadernos eleitorais?"; "Confirma que, em Outubro de 2000, enquanto ministro do Ambiente, deu alguma orientação no sentido do ICN apresentar proposta" de alteração dos limites da ZPE [Zona de Protecção Especial] do Estuário do Tejo?; "Teve conhecimento da colaboração do arguido Eduardo Capinha Lopes nas campanhas eleitorais do PS para as autárquicas de 2001, nomeadamente em Grândola, Santiago do Cacém, Moita, Barreiro e Alcochete e, em caso afirmativo, se essa colaboração influenciou a sua escolha para o desenvolvimento dos projectos de arquitectura do complexo Freeport?".
O despacho de 252 páginas prossegue depois concluindo que apenas foi possível apurar indícios suficientes para acusar Charles Smith e o seu sócio Manuel Pedro da prática do crime de "extorsão na forma tentada", uma vez que não se provou que muitas das verbas pedidas para pagar luvas e subornos lhes foram efectivamente pagas pelo grupo Freeport.
O despacho conclui, no entanto, que não foi possível apurar o destino de grande parte dos 1.826.254 euros pagos pela Freeport a Smith e a Pedro, sendo que mais de 473 mil foram levantados em numerário. A eventual prática de um crime de financiamento partidário ilegal foi arquivada, diz o despacho, por se tratar de um crime de natureza semipública, "não tendo sido apresentada queixa pela entidade competente".
A advogada de Charles Smith e Manuel Pedro, Paula Lourenço, disse ontem ao PÚBLICO que vai requerer a abertura da instrução do processo porque "a acusação é inexplicável, não faz sentido e é uma contradição". Nessa fase processual a questão da inquirição de José Sócrates já não poderá ser equacionada, mas nada obsta a que surjam reclamações hierárquicas por parte de alguns intervenientes no processo que obriguem a ponderar a sua reabertura.
Manuel António Pina no JN
A crer no Ministério da Educação, é para garantir "igualdade de oportunidades" a todos os alunos que, "em estreita colaboração com associações de pais (...) e autarquias", irão ser encerradas a partir de Setembro mais 701 escolas do 1º Ciclo, a juntar às 5 172 encerradas desde 2000.
Apesar de o anúncio ter sido feito com meio país a banhos, sucedem-se, de Norte a Sul, os protestos das associações de pais e autarquias "em estreita colaboração" com as quais o ME teria preparado a coisa.
A seguir a centros de saúde, maternidades, urgências e estações de CTT, 701 pequenas comunidades rurais do desertificado interior ficarão agora sem escola e 10 mil crianças dos 6 aos 10 anos serão forçadas a percorrer todos os dias dezenas de quilómetros até chegarem, exaustas e sonolentas, às indiferenciadas linhas de produção educativa que são as "mega-escolas" dos centros urbanos.
O presidente da Câmara de Bragança fala de casos, no concelho, em que as crianças terão que fazer diariamente duas viagens de mais de hora e meia para ir à escola. Só por humor negro alguém pode chamar a isso "igualdade de oportunidades".
Cimeira de Luanda vai aprovar um plano de promoção
A aprovação do plano para a promoção da Língua Portuguesa e a reestruturação do Instituto Internacional de Língua Portuguesa (IILP) será discutida hoje na VIII Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo da CPLP, em Luanda.
Este plano prevê a introdução do Português como língua de documentação das Nações Unidas, a publicação em Português de documentos da Assembleia Geral e do Conselho de Segurança, a criação de um grupo de tradutores especializados na ONU e ainda o desenvolvimento do Portal da Língua Portuguesa da CPLP e CPLP-TV. Ontem, na XV reunião do Conselho de Ministros da CPLP, o brasileiro Gilvan Müller de Oliveira, actual director do Instituto de Investigação e Desenvolvimento em Política Linguística, foi eleito director executivo do Instituto Internacional de Língua Portuguesa (IILP), divulgou a Lusa. O director executivo deste instituto - que tem como objectivos "a promoção, defesa, enriquecimento e difusão da língua portuguesa, como veículo de cultura, educação, informação e acesso ao conhecimento científico e tecnológico"-- é nomeado rotativamente e cabia ao Brasil a indicação do candidato.
Para um bom funcionamento do IILP foi considerada essencial a criação de comissões nacionais que propõem programas. Até ao momento, estão criadas as de Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Portugal e São Tomé e Príncipe. Timor-Leste finaliza o processo. O Instituto Internacional de Língua Portuguesa , na opinião do ministro Luís Amado, tinha "um desajustamento institucional face à organização" e para a presidente do Instituto Camões, Ana Paula Laborinho, "não tem tido o papel que poderia desempenhar". A sua refundação sairá reforçada desta cimeira e Laborinho espera que o instituto possa desempenhar esse papel de projectar internacionalmente a língua portuguesa, sem se sobrepor ao papel que as instituições, como o Instituto Camões, continuarão a desempenhar, disse à Lusa. I.C.
De regresso a casa, na Baixa de Lisboa, é frequente optar pelo trajecto que me faz atravessar a Praça da Figueira, que em final de dia se enche com skaters. Embora não seja o local ideal para aqueles realizarem as suas manobras, esta praça - bem no coração da cidade e nas costas doutra, que é provavelmente a praça mais emblemática de Lisboa, o Rossio - representa mais do que um ponto de encontro para os skaters; é uma praça que foi conquistada à cidade! Ali, partilham ritos e ritmo, lado a lado com uma mão-cheia de mendigos, turistas, algumas prostitutas de meia dezena de euros e ainda a Tribal Urbano (loja especializada e ponto de informação sobre o skate em Portugal).
Ainda tenho presente o dia em que pedi à minha mãe que me desse um skate como presente de aniversário. O pedido foi, como é óbvio, negado, pois a minha inquietude e traquinice já me haviam rendido umas belas cicatrizes. Contudo, tal não me demoveu de seguir o meu sonho de rolar sobre quatro rodas: acompanhado pelo meu grupo de amigos, montei uma pequena linha de montagem para construir karts e trotinetas ("teió", como lhes chamávamos), um DIY a partir de rolamentos e tábuas recicladas de um qualquer móvel.
Sim, gosto dos skaters, tenho vindo a comprar pranchas assinadas por artistas como Damien Hirst, a aprender com a forma apaixonada e quase religiosa como estes se entregam a este desporto de cidade, tal qual surfistas no mar. Agrada-me, sobretudo, observar como se tem vindo a construir uma indústria à volta desta comunidade, e é com bastante interesse que tenho vindo a acompanhar, de há um ano a esta parte, o crescimento do projecto Uganda Skateboard Union. O seu skatepark em Kitintale, um subúrbio de classe operária na capital do Uganda (Kampala), é resultado da iniciativa de um grupo de miúdos, que, depois de verem na televisão um campeonato de skate, decidiram construir o seu próprio parque. Essa iniciativa não só sensibilizou a comunidade local, como atraiu atenção internacional nas entidades ligadas ao skate, que não fizeram tardar o envio de donativos essenciais para a prática do desporto naquele que é o único skatepark na costa leste de África.
Os skaters não buscam a aceitação dos homens, não reclamam zonas verdes; aceitam a rua tal como ela lhes é apresentada e deixam-se apenas deslizar... sobre aquelas quatro pequenas rodas, tentando não perder o equilíbrio, testando os seus limites. Sabem que a sociedade os coloca na margem, mas não se esforçam para contrariar isso. Não que sejam passivos, mas não são do tipo de reclamar qualquer decisão política para a melhoria da vida dos jovens nos grandes centros urbanos. Simplesmente adaptam-se a essa urbanidade claustrofóbica, sem grandes reflexões ideológicas.
Atravesso a praça e observo-os de forma discreta; sei que não gostam de se sentir alvo da curiosidade. Apresso o passo, caminhando até a minha presença deixar de ser incomodativa, para depois me voltar e fixar o olhar na poesia dos movimentos, na elasticidade dos corpos e na forma desleixada como se vestem.
Músico
A Constituição, para lá de muita ideologia, tem parágrafos de programa de Governo. E isso, sim, é um problema. E grande
A proposta de revisão constitucional causou um sobressalto num país farto de crises e casos e que, da esquerda à direita, tem uma crença no poder genesíaco das leis que só encontra paralelo no fervor que os fundamentalistas islâmicos devotam ao Corão, enquanto verdade revelada. Não por acaso o PSD acha que, mudando a Constituição, nos mudaria a vida e muito menos por acaso, entre os indignados com a proposta de rever a constituição, se reage como se nos idos de 1976 uma qualquer divindade tivesse ditado todo aquele articulado aos deputados da Constituinte. Mudá-lo cai, portanto, no domínio da heresia ou, politicamente falando, no campo do golpe de Estado. Desde a primeira revisão constitucional, que teve lugar em 1982, que a acusação de golpe de Estado se abate sobre os autores das propostas de revisão. Esta acusação teve mesmo um lado institucional com o Comité Central do PCP a produzir um comunicado em que acusava a AD de orquestrar um golpe de Estado através da revisão constitucional. Note-se que até 1982 o Conselho da Revolução (CR) funcionava como Tribunal Constitucional e exercia uma tutela sobre o Governo, a Assembleia da República e sobre o próprio Presidente da República, cujos poderes eram maiores do que os actuais mas sempre em articulação com o CR. Até 1989 não podia existir televisão privada em Portugal e ainda hoje a Constituição nos impõe não apenas o socialismo mas também que combatamos os latifúndios. É claro que agora ninguém se preocupa com o golpe de Estado contra o Conselho da Revolução mas imediatamente se ouviu falar do dito golpe a propósito do proposta social-democrata do fim da gratuitidade do Serviço Nacional de Saúde.
Num primeiro olhar, a Constituição portuguesa é uma prova do que pode ser um país preso na retórica revolucionária: apesar de o PCP ter sido o grande derrotado das eleições de 1975, o texto da Constituição assegurou por via legal aquilo que o PCP não impôs por via revolucionária. Mas o problema da Constituição não são as sobras daquilo que bondosamente se define como folclore do PREC e tiques de bloco central subjacentes às revisões de 1982 e 1989. A questão é muito mais profunda e muito mais transversal politicamente falando, pois a Constituição, para lá de muita ideologia, tem parágrafos de programa de Governo. E isso, sim, é um problema. E grande.
Andamos, por exemplo, todos muito animados a discutir se na Constituição o despedimento deve ser permitido por "razão atendível" ou por "justa causa" mas cabe perguntar se este detalhe deve ser inscrito numa Constituição. Não deve. Essa é matéria para os programas dos partidos e sobre a qual os próprios partidos vão actualizando o seu discurso e as suas propostas em função da realidade, pois aquilo que é possível ou válido numa década já está desactualizado na seguinte.
Dir-se-á que a realidade acaba por se impor. Tal como aconteceu em 1989, quando, perante a evidência de que nas aldeias da raia já ninguém via a RTP mas sim os canais espanhóis e que os telhados das cidades se enchiam de parabólicas, se revogou finalmente o artigo da Constituição que proibia a televisão privada, também no século XXI acabaremos a constatar que num país em que há mais velhos do que crianças não é possível manter um SNS gratuito. Como se percebe, este lado executivo da nossa Constituição - que a leva a definir custos ou ausência deles para os serviços de saúde e ensino - tem consequências muito mais danosas na vida dos portugueses do que aquelas disposições anedóticas do tempo do PREC sobre a televisão privada, pois é óbvio que ser colocado perante a evidência da falta de financiamento para a segurança social ou para o SNS é muito mais grave do que ter apenas televisão pública.
O lado ideológico da Constituição atrasa-nos a vida. O lado executivo da Constituição complica-nos a vida. Mas não só. E aqui chegamos ao que é realmente preocupante: este lado executivo da Constituição acentua a ruptura entre as gerações que viram constitucionalmente garantidos serviços universais e gratuitos ou empregos para toda a vida e os jovens que pagam e sofrem o reverso de todo esse garantismo. Os "recibos verdes", a dívida do país que terá de ser paga, os seguros de saúde, os planos poupança-reforma, a subcontratação que fazem parte da vida das gerações mais novas são o reverso dos garantismos constitucionais usufruídos pelos mais velhos.
Houve uma geração que se sentou em 1976 na Constituinte e que fez as revisões de 1982 e 1989. Essa geração achou que a nossa Constituição devia ser uma espécie de programa governamental virtuoso vertido sob a forma de lei fundamental. Da esquerda à direita não pareceu nem parece incomodar que a Constituição faça de programa de Governo. A factura social e económica dessa parte executiva da Constituição foi endossada às gerações futuras. Será delas e não de nós que virá o grande julgamento sobre esta Constituição.
P.S. 1: Se o PSD quer fazer respeitar a sua proposta de revisão constitucional, então deveria apresentá-la enquanto tal e não colocar umas fontes a esquartejá-la em sound bytes para jornalista ouvir.
P.S. 2: Foram necessários mais de 20 anos para que voltássemos a falar da Constituição, pois as revisões de 1992, 2001, 2004 e 2005 surgiram-nos como acertos impostos pela nossa integração europeia. Lastimavelmente já nem recordamos que a revisão de 2005 se prendia com o referendo ao Tratado de Lisboa que depois acabámos por não poder votar porque era muito urgente e muito complicado. (Esta decisão foi um erro profundo e que a UE pagará caríssimo, pois o pior que pode acontecer a uma Constituição não é ter um percurso difícil, é, sim, ser ignorada.) Convém também não esquecer que em 2008 aconteceu em Portugal uma revisão constitucional. É certo que não aconteceu como devia, mas aconteceu. Refiro-me à aprovação do Estatuto dos Açores, que implicou a diminuição dos poderes do Presidente da República e da Assembleia da República e o aumento dos poderes da Assembleia Legislativa dos Açores. Ensaísta
A "razão atendível" para despedir não é invenção do PSD. E obriga-nos a recuar ao Verão do gonçalvismo
Citando Bertold Brecht “Todos os dias os ministros dizem ao povo Como é difícil governar. Sem os ministros O trigo cresceria para baixo em vez de crescer para cima”. O problema é quando o trigo quer crescer para cima e as intempéries e as ervas daninhas não o deixam…E o trigo faz falta para o pão!!! E o pão mata a fome !!!
Ao longo dos últimos anos, têm sido variadas as “intempéries”que geraram instabilidade nas escolas, (não deixando o trigo crescer…) desde a criação dos primeiros agrupamentos, às alterações dos planos curriculares, ao estatuto disciplinar do aluno, às alterações ao estatuto da carreira docente (divisão da carreira docente, modelo de avaliação do desempenho dos docentes), só para sublinhar as que mais impacto causaram…
Para que as “sementes” possam germinar sem obstáculos e consequentemente para que as Escolas tenham condições para garantir a qualidade, são necessários tranquilidade, rigor e exigência como forma de garantir o ambiente propício à eficácia nos processos ensino-aprendizagem. As Escolas não se compadecem com alterações permanentes ao nível da sua organização e ausência total de um olhar mais atento ao sucesso real dos alunos, que passa pela reorganização curricular, novos programas, uma cuidada e exigente formação inicial de Professores, um devolver da autoridade aos mesmos de forma a garantir um ambiente propício ao trabalho dentro da sala de aula, uma co-responsabilização dos Pais/Encarregados de Educação pelo cumprimento das regras escolares por parte dos seus educandos, uma aferição com a introdução de exames nacionais no fim de cada ciclo e, no ano terminal do Secundário (12º ano) a todas as disciplinas da Formação Geral e Específica.
Desde o dia 14 de Junho de 2010, data em que foi publicada em Diário da República a Resolução 44/2010 do Conselho de Ministros, abateram-se novas “intempéries” sobre as Escolas quer no que se refere ao número mágico de alunos (21) limite para que não sejam encerradas as Escolas do 1º Ciclo, quer no que se refere à criação dos “Mega-Agrupamentos” designados nesta Resolução como “Unidades de Gestão”.
O fecho das Escolas, com toda a implicação que tem no contínuo desertificar das zonas interiores, pode justificar-se se os alunos não tiverem equipamentos adequados à sua formação/educação mas, houve muitas freguesias que apetrecharam as suas Escolas investindo em equipamentos e criando condições idênticas às das Escolas para onde se deslocam agora os alunos. Ora esta medida tem que ser tomada em conjunto com as autarquias e, o facto de ter menos de 21 alunos, não deve ser determinante para o encerramento da Escola desde que a mesma reúna condições para realizar um trabalho sério e com qualidade. É preciso ter em atenção quão traumatizante é para os alunos, ainda crianças, saírem do seu meio familiar para um ambiente estranho e aí permanecerem durante todo o dia.
Por outro lado, a constituição dos Mega-Agrupamentos feita de forma apressada e tendo exclusivamente em conta a localização geográfica, revela o carácter economicista desta medida, o que, a ser posta em prática, se traduzirá numa inequívoca deterioração da qualidade da escola pública, através da desvalorização das questões pedagógicas, dificultando a promoção das aprendizagens, instituindo a direcção à distância, o que cria condições para mais indisciplina e, em resultado disso, mais insucesso e abandono escolar, bem como da indisciplina. Assistimos, pois, a uma quantificação pedagógica em detrimento evidente da qualidade. A gestão de proximidade é fundamental para a resolução de problemas de natureza pedagógica e disciplinar, os alunos mais novos (aqueles cujas Escolas vão ser “engolidas” pelas Escolas Secundárias) necessitam de uma presença permanente do Director/ Presidente, a quem reconheçam autoridade e a quem obedeçam em caso de perturbação. O abandono escolar não se resolve com o fusão das Escolas em “Unidades de Gestão”, designação que mais se adequa a unidades empresariais, que de modo nenhum queremos confundir com espaços de aprendizagem e formação.
Num documento enviado à Senhora Ministra da Educação, um grupo de Directores do distrito de Coimbra afirma não compreender que:
“- Se tenha avançado com a mudança do modelo de gestão e administração das escolas que foi polémico, para, passado um ano, se pôr tudo em causa, invocando a necessidade de implementação dos novos agrupamentos, que estavam já previstos;
- Não sejam respeitados os projectos para 4 anos elaborados pelos órgãos de direcção e que começam agora a dar os seus frutos;
- Se avance com as fusões nesta altura do ano, em que as escolas estão preocupadas com as avaliações dos seus alunos e já têm muito trabalho feito na preparação do próximo ano lectivo com base nos seus projectos educativos;
- Se lance um novo modelo antes de se definirem as regras a que estes têm que obedecer, deixando as escolas num vazio legislativo;
-O Ministério não respeite o trabalho dos seus colaboradores e que ignore que estes trabalham intensamente para que as suas escolas e alunos tenham sucesso;
-A qualidade de ensino e as questões pedagógicas sejam preteridas a favor de medidas administrativas desenhadas nos gabinetes sem um verdadeiro conhecimento da realidade”.
Subscrevi na íntegra este documento e afirmo, com toda a convicção que o Ministério da Educação ainda está a tempo de repor a serenidade nas Escolas.
Termino como comecei, com uma citação de um poema de Brecht adequado aos tempos que vivemos: “Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem”.
Maria do Rosário Gama
Directora da Escola Secundária Infanta Dª Maria (Coimbra)
"Não será no que respeita à avaliação do programa que o Plano da Matemática I poderá ser criticado. Ao longo dos seus três anos de vida, a comissão de acompanhamento produziu seis relatórios de avaliação intercalar (dois em cada ano lectivo), que foram, por sua vez, auditados externamente, e um documento final, entregue ao Ministério da Educação ainda em 2009. O problema é que é quase impossível conhecer as conclusões dessas avaliações. O Expresso pediu diversas vezes ao Ministério da Educação a divulgação do relatório final, mas sem sucesso. Nem tão pouco conseguiu uma explicação para o facto de o Ministério da Educação querer manter sigilo sobre o documento. O Expresso também não conseguiu saber qual o orçamento previsto para o Plano da Matemática II nem quanto foi efectivamente gasto no primeiro Plano."
Nenhum aluno do 8.º ano com mais de 15 anos de idade concluiu o ensino básico, ao abrigo de um regime excecional criado este ano pelo Governo, disse à Lusa o Ministério da Educação.
“Dos alunos do 8.º ano, maiores de 15 anos, que se auto-propuseram a exames do 9.º ano, informa-se que, apesar de se terem registado algumas notas positivas nos exames nacionais de Língua Portuguesa e Matemática, nenhum destes alunos concluiu o ensino básico por esta via”, afirma a tutela, numa resposta a questões colocadas pela Lusa.
Segundo uma medida transitória no âmbito do alargamento da escolaridade obrigatória para 12 anos, os alunos com mais de 15 anos retidos no 8.º ano podiam este ano fazer os exames nacionais do 9.º ano, para concluírem o ensino básico.
O Governo estimava que seriam cerca de 300 alunos, "no máximo", em condições de realizar os exames nacionais do 9.º ano de Língua Portuguesa e Matemática, bem como os exames de escola de equivalência à frequência das restantes disciplinas.
Realizaram a prova de Língua Portuguesa 149 alunos e a de Matemática 145 estudantes.